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Superior Tribunal Militar mantém condenação por desacato de civil que fez gesto obsceno para Exército

Exército na Maré

Superior Tribunal Militar mantém condenação por desacato de civil que fez gesto obsceno para Exército

Por Júlia Valente

Mais uma vez na semana passada o direito expôs sua face mais autoritária quando o Superior Tribunal Militar (STM) manteve a decisão que condenou um civil a seis meses de detenção pelo crime de desacato durante operação do Exército no Complexo da Maré, na cidade do Rio de Janeiro.

Como já nos manifestamos anteriormente, o uso das Forças Armadas no papel de polícia (a “policização” das FFAA, prevista no art. 142 da Constituição Federal), o que ocorre com crescente frequência no Brasil, constitui uma das facetas da militarização da segurança pública e contribuiu para uma atuação belicista e violenta contra determinadas camadas da população brasileira.

Segundo informações do STM, em maio de 2015, uma patrulha tentou abordar quatro pessoas suspeitas próximo ao local conhecido como “muro da formiguinha” no Complexo da Maré, sendo que três fugiram. O homem que ficou para trás teria feito gestos obscenos para a tropa e foi preso em flagrante, sendo denunciado pelo crime de desacato, previsto no art. 299 do Código Penal Militar. Apesar do Ministério Público Militar ter se manifestado pela absolvição do Réu, ele foi condenado em primeira instância à pena de 6 meses de detenção, com suspensão condicional da pena pelo prazo de dois anos, o direito de apelar em liberdade e o regime prisional inicialmente aberto.

A defesa recorreu ao STM, mas o relator, Ministro José Barroso Filho, negou provimento ao recurso alegando ser pacífica a jurisprudência do STM quanto à competência da Justiça Militar para processar e julgar delitos praticados contra integrantes das Forças Armadas, quando empregados em Operações de Garantia da Lei e da Ordem. Também afirmou que o Supremo Tribunal Federal (STF) já reconheceu a conformidade da Lei nº 9.839/99, que inseriu na Lei nº 9.099/95 proibitivo à aplicação dos institutos da legislação referente aos Juizados Especiais Criminais no âmbito da Justiça Militar da União. O Plenário do STM, por unanimidade, acatou o voto do relator e manteve a condenação do Réu.

Tal condenação é totalmente desarrazoada, uma vez que o crime de desacato é absolutamente  inconstitucional (leia mais aqui), por ser incompatível com a Convenção Americana de Direitos Humanos (Pacto de San José da Costa Rica), como já se manifestou  a Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) em dezembro do ano passado. Além disso, caso o ato fosse praticado contra um civil, seriam aplicados os dispositivos da Lei dos Juizados Especiais (Lei 9.099/95) sendo possível a transação penal ou a suspensão condicional do processo, ou, no caso de  condenação, seria possível a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direito.

O Ministro relator do processo afirmou ser “inadmissível o desrespeito à legítima ação das Forças Armadas quando atuam em Operações de Garantia da Lei e da Ordem; o Estado Democrático de Direito assim o exige”. Ora, o que o Estado Democrático de Direito exige é a descriminalização do desacato.

 

Equipe VRP

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