Cerveja contaminada: entenda como funciona a responsabilidade civil em casos como o da Belorizontina

Nas últimas semanas, os mineiros têm acompanhado com preocupação os casos de internações de pessoas diagnosticadas com misteriosa síndrome nefroneural. As investigações têm indicado que a doença estaria relacionada à intoxicação pela substância dietilenoglicol (DEG) presente em determinados lotes da cerveja Belorizontina, um dos rótulos da cervejaria Backer. Análise encomendada pela própria cervejaria confirmou a […]

Nas últimas semanas, os mineiros têm acompanhado com preocupação os casos de internações de pessoas diagnosticadas com misteriosa síndrome nefroneural. As investigações têm indicado que a doença estaria relacionada à intoxicação pela substância dietilenoglicol (DEG) presente em determinados lotes da cerveja Belorizontina, um dos rótulos da cervejaria Backer. Análise encomendada pela própria cervejaria confirmou a presença da substância e a empresa se manifestou recomendando que consumidores não bebam a Belorizontina e informou que prestará o suporte necessário aos pacientes e familiares. Enquanto as investigações para apurar eventual responsabilidade criminal pelo caso avançam, é sempre bom lembrar de como o Código de Defesa do Consumidor define a responsabilidade civil em casos como esse.

Responsabilidade Civil do fornecedor de acordo com o Código de Defesa do Consumidor

Nos termos do art. 3º do Código de Defesa do Consumidor (CDC), fornecedor é a “pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividade de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços”. Já o art. 2º estabelece como consumidor “toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final”. No caso, não há dúvidas de que a cervejaria Backer se enquadra na categoria de fornecedora e que as vítimas de intoxicação são consumidores. Estando presente a relação consumerista, aplica-se o disposto no CDC quanto à responsabilidade civil.

O fabricante de um produto é objetivamente responsável, isto é, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos na fabricação do produto (art. 12 do CDC). Isso quer dizer que independentemente da contaminação pela substância ter ocorrido propositalmente ou não, a empresa é responsável pelos danos causados em decorrência do produto que coloca no mercado. Em eventual ação judicial contra o fornecedor, poderá ser pleiteada indenização por danos morais e materiais, inclusive lucros cessantes (o que a pessoa que ficou doente ou foi internada deixou de ganhar por estar impossibilitada de trabalhar).

Caso a empresa consiga comprovar que a culpa pela contaminação foi de terceiro, algum fornecedor, por exemplo, poderá cobrar o que eventualmente tiver gasto para reparação dos danos dos consumidores lesados dos demais responsáveis, segundo sua participação na causa do evento danoso (é o chamado direito de regresso).

Como constituir provas

É importante que o consumidor que tenha sua saúde ameaçada em decorrência de um produto constitua provas da relação entre a doença e o consumo do produto. No caso da cerveja, exames e laudos médicos que atestem a presença do DEG no sangue associada a provas de que o produto foi consumido – rótulo da cerveja, notas fiscais, testemunhas etc., servem para a comprovação do direito caso a pessoa decida entrar na justiça. Em casos envolvendo a relação de consumo, tendo em vista que o consumidor é a parte mais frágil da relação, o CDC coloca a possibilidade de inversão do ônus da prova, o que faz com que o fornecedor seja obrigado a comprovar que o dano não se deu em virtude de inadequação do seu produto. Para cada caso específico, é sempre bom consultar um advogado para obter orientações de como constituir provas.

Comprei um produto impróprio ao consumo (cerveja do lote contaminado), e agora?

O fornecedor também é responsável pelos vícios do produto oferecido. Quando esses forem impróprios para consumo – como, por exemplo, produtos deteriorados, alterados, adulterados, avariados, falsificados, corrompidos, fraudados, nocivos à vida ou à saúde ou em desacordo comas normas regulamentares de fabricação – tem o dever legal de substituir o produto por outro da mesma espécie ou restituir a quantia paga, monetariamente atualizada, sem prejuízo de eventuais perdas e danos (art. 18 do CDC).
Você já sofreu algum prejuízo à sua saúde em decorrência de um produto? Conhece alguém que tenha sofrido? Compartilhe este texto! A Valente Reis Pessali atua em ações de responsabilidade civil e está à disposição para atendê-lo e orientá-lo quanto às providências judiciais cabíveis em cada caso.

Júlia Leite Valente - Advogada Sênior e Sócia Fundadora

Júlia Leite Valente

Advogada sênior sócia fundadora

É mestra em Direito Penal pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) e bacharela em Direito pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), com formação complementar pela Université de Lille, na França. É autora do livro UPPs: Governo Militarizado e a Ideia de Pacificação.