Valente Reis Pessali Advocacia e Consultoria

Jovens Arquitetos e Urbanistas: violações de direitos trabalhistas

Por Júlia Leite Valente

Como em muitas outras áreas, no ramo da Arquitetura as irregularidades trabalhistas são extremamente frequentes. Segundo o Censo dos Arquitetos e Urbanistas realizado pelo Conselho de Arquitetura e Urbanismo do Brasil (CAU) em 2012, 38% dos profissionais da área são assalariados, enquanto 34% fornecem serviços como autônomos e 20% são donos de escritórios e empresas. Sendo assim, a maioria dos profissionais trabalha por conta própria. Além disso, o perfil dos arquitetos e urbanistas atuantes no Brasil é jovem: 58% têm menos de 40 anos, sendo que 40% dos profissionais têm entre 26 e 35 anos*.

Para o arquiteto urbanista recém formado, dois caminhos são os mais frequentes: a prestação de serviço como autônomo ou o emprego em escritório ou empresa.

O trabalho como empregado é regulado pela Consolidação das Leis do Trabalho e pelos acordos e negociações coletivas trabalhistas, aplicando-se também a Resolução nº 38/2012 do CAU que dispõe sobre a fiscalização do cumprimento do Salário Mínimo Profissional. O que caracteriza a relação de emprego é a conjugação de elementos como subordinação (estar subordinado a um chefe, cumprir ordens), onerosidade (receber remuneração pelo trabalho prestado), não eventualidade (exercer o trabalho com regularidade) e pessoalidade (ser o empregado pessoa física e o empregador permanecer o mesmo). Sendo assim, para o Direito do Trabalho, ainda que não haja assinatura da carteira como arquiteto, pode ser reconhecida a relação de emprego com todas as suas consequências se presentes esses elementos.

A Lei n. 4.950A/66 determina que o Salário Mínimo Profissional é de 6 salários mínimos para as 6 primeiras horas de trabalho, sendo a 7ª e 8ª horas remuneradas com 25% de acréscimo no valor da hora normal. O empregado tem também direito às horas extras trabalhadas: para quem trabalha 8h diárias, toda hora superior à 8ª diária, superior às 44h semanais, devem ser remuneradas com 50% de acréscimo sobre a hora normal; para quem trabalha 6h diárias, as horas além de 6 são consideradas extras. O trabalho em dias de repouso (fim de semana) deve ser remunerado em dobro.

Já que o Salário Mínimo Profissional da categoria é relativamente valorizado em comparação com outras profissões, é muito comum que os arquitetos e urbanistas sejam contratados com uma outra função anotada na carteira de trabalho (Auxiliar Administrativo, Auxiliar de Projetos, Desenhista, Projetista, etc). Esta prática é ilegal, pois visa burlar os direitos trabalhistas. Em razão do princípio da primazia da realidade, quem é contratado para outra função mas realiza atividade de arquiteto urbanista pode pleitear o pagamento da diferença com relação ao Salário Mínimo Profissional.

É também praxe a contratação do arquiteto urbanista como prestador de serviço autônomo ou por meio de Microempresa Individual (MEI). Neste caso, a relação de trabalho se caracteriza não pela subordinação, mas pela autonomia, o que quer dizer liberdade para trabalhar como, quando e onde quiser, desde que realize o serviço contratado. Neste caso, o arquiteto pode trabalhar em sua casa ou escritório particular e prestar serviços para quantos tomadores quiser, recebendo honorários em troca (e não um salário fixo). O prestador de serviço é um empreendedor (pessoa física ou jurídica) que arca com os riscos do negócio.

Entretanto, nesses casos, as irregularidades são extremamente comuns. Quando o prestador de serviço atua como empregado, se presentes os elementos da relação de emprego acima mencionados, isto é, se recebe ordens, trabalha na sede da empresa, tem horários a cumprir, recebe um salário fixo mensal etc., o que há é uma fraude à legislação trabalhista. Nestes casos, o empregado pode buscar seus direitos e o reconhecimento da relação de emprego com todas as suas vantagens.

Se você, arquiteto e urbanista, recebe ordens, cumpre horário e tem um salário, você é empregado. Busque a garantia dos seus direitos, exija a assinatura da Carteira de Trabalho como arquiteto e saiba quanto vale o seu trabalho. Se seus direitos foram violados, busque a Justiça do Trabalho. Se quiser ser autônomo, exija respeito à sua autonomia e tenha sempre contrato formalizado com os clientes para se resguardar, lembrando que você assume os riscos da prestação de serviço.

Júlia Leite Valente - Advogada Sênior e Sócia Fundadora

Júlia Leite Valente

Advogada sênior sócia fundadora

É mestra em Direito Penal pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) e bacharela em Direito pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), com formação complementar pela Université de Lille, na França. É autora do livro UPPs: Governo Militarizado e a Ideia de Pacificação.