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Liberdade de expressão x proibição ao anonimato

Liberdade de expressão x proibição ao anonimato

Por Mariane Reis

Em 2013 o Estado do Rio de Janeiro promulgou a Lei nº 6.583/13 que objetiva regular o direito constitucional de reunião para manifestação de pensamento, proíbe o uso de máscaras e qualquer outra forma de ocultação do rosto em manifestações públicas. A promulgação da lei foi de encontro com o movimento popular de 2013, ligado aos protestos que ocorreram em todo o país durante a Copa das Confederações. Enquanto uma organização privada de âmbito internacional, como a FIFA, utilizava-se das forças repressoras do Estado para conter manifestantes descontentes da organização e financiamento estatal do megaevento, um grupo de manifestantes utilizou da tática black bloc (de enfrentamento direto e anônimo aos agentes públicos da repressão e aos símbolos econômicos que financiaram o megaevento) para enfrentar a repressão do Estado e desmascarar os valores em disputa, patrimônio x humano. A jornalista Eliane Brum aponta para a questão:

Ao quebrarem patrimônio material como forma de protesto e serem transformados numa espécie de inimigos públicos, aponta-se onde está o valor e também a disputa. Enquanto a destruição dos corpos de manifestantes pela Polícia Militar é naturalizada, a dos bens é criminalizada. Reafirma-se, mais um vez, que os corpos podem ser arruinados, já que o importante é manter o patrimônio, em especial o dos bancos e grandes empresas, intacto.

Uma mídia parcialmente imbuída de endossar as forças repressoras, que muitas vezes se utilizam do anonimato e da violência cruel e gratuita, auxiliou na construção de um imaginário social que colocou os black blocs como inimigos da ordem social, inimigos públicos. E o Estado do Rio de Janeiro tratou de promulgar a Lei que proibia o uso de máscaras em manifestações.

Diversas entidades condenaram a ação e o Partido da República ajuizou ação direta de inconstitucionalidade contra a Lei. O Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro julgou o pedido improcedente. O recurso extraordinário no Supremo Tribunal Federal – STF, argui atentado ao art. 5º, II, IV e XVI, da Constituição Federal e defende que a restrição ao uso de máscara limita indevidamente o direito de reunião, além de ofender os princípios da legalidade, da razoabilidade e da proporcionalidade.

Esta semana o Instituto Brasileiro de Ciências Criminais – IBCCrim, requereu apresentação de amicus curiae no Recurso Extraordinário com Agravo nº 905.149/RJ dizendo que o tema “debatido é central, pois poderá garantir a efetividade de garantias constitucionais inerentes ao Estado Democrático de Direito sem indevidas restrições”.

O Relator do Recurso, Ministro Luís Roberto Barroso, afirmou que o que está em discussão é o direito à liberdade de expressão e a proibição ao anonimato. Agora cabe ao STF enfrentar o mérito da discussão e decidir sobre o direito à manifestação e à liberdade de expressão.

 

Mariane Reis Cruz - Advogada Sênior e Sócia Fundadora

Mariane Reis Cruz

Advogada sênior sócia fundadora

É mestra e bacharela em Direito pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), com formação complementar em Direito e Políticas Públicas pela Université de Lille, na França, e Humanidades pela Universidad de la República, no Uruguai. É também bacharela em Letras pela UFMG.