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VRP fala direito! Intervenção Federal na segurança pública do Rio de Janeiro

VRP fala direito! Intervenção Federal na segurança pública do Rio de Janeiro

Por Júlia Valente

O Presidente Michel Temer decretou na sexta-feira passada intervenção federal até 31 de dezembro de 2018, na área de segurança pública, com o objetivo de “pôr termo a grave comprometimento da ordem pública no Estado do Rio de Janeiro”. Muitas pessoas vieram nos perguntar nos últimos dias sobre a intervenção federal no Rio de Janeiro. Por isso resolvemos gravar este vídeo para esclarecer alguns pontos.

Em primeiro lugar, é necessário esclarecer o que é Intervenção Federal. O Brasil é um Estado federativo, o que quer dizer que os entes possuem autonomia, de forma que a União não pode intervir nos Estados senão em situações excepcionalíssimas previstas no art. 34 da Constituição.

Uma dessas hipóteses (inciso III) é pôr termo a grave comprometimento da ordem pública. Esse dispositivo, entretanto, nunca foi aplicado desde que a Constituição está em vigor e não se sabe como a intervenção funciona na prática. A Constituição não fala, por exemplo, se a intervenção pode ser parcial, como fez Temer.

O que o Decreto faz é retirar do Governador do estado do Rio de Janeiro a gestão da segurança pública, nomeando como Interventor o General Braga Netto, que responde diretamente ao Presidente da República. Ou seja, o Governo Federal está no comando da segurança do Rio de Janeiro.

Mas o que motiva essa intervenção? É importante ressaltar que o Rio de Janeiro é apenas o 10º estado mais violento do Brasil, segundo o Anuário Brasileiro de Segurança Pública. Sendo assim, o critério para decretar uma medida tão grave não é exatamente a crise na segurança, mas muito mais uma jogada política e publicitária do Presidente.

A cidade do Rio sempre teve muita visibilidade, é uma cidade que projeta a imagem do Brasil para o mundo. Sendo assim, aqui, mais uma vez, como em todas as vezes em que as Forças Armadas atuaram na segurança pública na cidade do Rio de Janeiro o objetivo é muito mais dar uma resposta à sociedade, gerar uma sensação de segurança e de que “algo está sendo feito”, principalmente em um ano eleitoral. Cito como exemplo a ocupação da Maré, em que foram gastos mais de 600 milhões de reais em uma ocupação fracassada.

Prova disso é que não existe um plano estratégico, sequer uma metodologia de como a intervenção vai funcionar. As falas do interventor deixam claro de que isso sequer foi pensado.

O art. 2º, parágrafo único do Decreto estabelece que o cargo de Interventor é de natureza militar. Aqui reside o aspecto mais grave. A intervenção federal prevista na Constituição permitiria substituir a autoridade política estadual pela federal, mas não uma autoridade civil por uma militar. O cargo deve ter natureza civil, mesmo que um militar a ocupasse. No entanto, o decreto estabelece uma natureza militar para o cargo, ou seja, fala que ele está integrado ao regime das Forças Armadas e sujeito à Justiça Militar. Isso é extremamente autoritário, pois dá um caráter militar à intervenção.

Outro problema é que a Intervenção abre espaço para uma ainda maior militarização da segurança pública. As Forças Armadas, que não são agentes de segurança pública, não são treinadas para o policiamento, mas para a guerra, só podem ser empregadas excepcionalmente, em Operações de Garantia da Lei e da Ordem, que estão cada vez mais sendo banalizadas pelos governos. No Rio de Janeiro a presença de militares já se tornou fato normalizado na paisagem urbana.

O parágrafo 3º do artigo 3º do Decreto determina que “o Interventor poderá requisitar a quaisquer órgãos, civis e militares, da administração pública federal, os meios necessários para consecução do objetivo da intervenção”. Ou seja, para conseguir “pôr termo a grave comprometimento da ordem pública no Estado do Rio de Janeiro” – que é um objetivo bastante abstrato -, o interventor poderá requisitar a atuação das Forças Armadas.

O que difere a situação agora de outras vezes em que as FFAA atuaram na segurança é que sempre atuaram sob ordens do governo do estado. Agora quem manda não é o governo do estado, mas um General. A experiência prova que em nenhuma das vezes que as Forças Armadas atuaram na segurança pública houve uma real articulação entre as forças federais e estaduais. Não temos resultados disso a não ser o espetáculo.

É impossível que até o final do ano o interventor consiga resolver os problemas da ordem pública na cidade, recuperando instituições extremamente sucateadas, corrompidas e defasadas. Os problemas são profundos e estão relacionados a décadas de um modelo falido de segurança. Isso não vai mudar em poucos meses.

Precisamos de uma polícia mais democrática, não uma polícia comandada por um interventor militar.

Tem dúvidas sobre a intervenção? Deixe sua pergunta nos comentários do vídeo.

 

Equipe VRP

Os artigos produzidos por advogados e advogadas especialistas em diversas áreas do direito que colaboraram com a produção dos conteúdos do Blog da VRP Advocacia e Consultoria.