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Período de Interstício:  o que é e quais as consequências do seu descumprimento?

As bolsas de estudo no exterior da Capes e do CNPq prevêem, dentre as obrigações do bolsista, a necessidade de retornar ao Brasil após o fim dos estudos que ensejaram a concessão da bolsa e a permanência no país pelo período equivalente ao da bolsa concedida – é o chamado período de interstício.

Muitas vezes, contudo, por oportunidades profissionais ou questões pessoais, essa alternativa se torna inviável para o ex-bolsista, que acaba se vendo obrigado a permanecer no exterior ou a sair do Brasil após o cumprimento parcial do interstício. Isso implica no descumprimento de uma obrigação que tem consequências importantes que devem ser consideradas no momento da escolha.

Neste artigo, você poderá saber um pouco mais sobre o período de interstício envolvendo bolsa de estudos no exterior. Confira!

Para que serve o período de interstício?

A principal finalidade do período de interstício é garantir que os bolsistas retornem ao Brasil após concluírem seus estudos no exterior e contribuam para o desenvolvimento da pesquisa e da educação no país. Durante esse período, os bolsistas têm a oportunidade de multiplicar o conhecimento adquirido no exterior em projetos e atividades acadêmicas no Brasil.

Isso não apenas enriquece a comunidade acadêmica nacional, mas também fortalece a cooperação internacional e promove o avanço da pesquisa e da inovação em território brasileiro. O período de interstício, portanto, desempenha um papel fundamental na formação de recursos humanos altamente qualificados, no fortalecimento de redes internacionais de cooperação e na qualificação da pesquisa científica e da produção tecnológica no país.

O que prevêem as normas da Capes e do CNPq sobre o período de interstício?

As atuais normas da Capes (Regulamento para Bolsas no Exterior – Portaria 289/2018) prevêem que o início do período de interstício é determinado a partir da data de retorno do bolsista ao Brasil ou, em casos excepcionais, a partir da aprovação da permanência no exterior após a conclusão dos estudos. O período máximo para sua integralização é de sessenta meses.

O monitoramento das atividades realizadas durante o período de interstício é feito mediante o envio de relatórios periódicos, que são analisados por consultores científicos ad hoc ou pelo Grupo Assessor Especial (GAE) da Diretoria de Relações Internacionais (DRI) da Capes.

Vale ressaltar que, segundo as regras atuais, no caso das modalidades “sanduíche”, o período de interstício se encerra com a conclusão dos estudos no Brasil que motivaram a concessão da bolsa no exterior.

Em situações excepcionais e mediante autorização expressa da Capes, é possível cumprir o período de interstício no exterior, o que dependerá da aprovação de proposta de novação.
Já no caso do CNPq, o Regulamento de Bolsas no Exterior (RN 007/2018), prevê a obrigação de retornar ao Brasil em até 30 dias após o término da vigência da bolsa e permanecer no país por período equivalente à vigência.

Também nesse caso, a obrigação pode ser substituída por outra que tenha relevância estratégica para o desenvolvimento da Ciência, Tecnologia e Inovação no Brasil, assegurando o ressarcimento do investimento feito pelo País na formação do bolsista. Essa substituição, contudo, deve seguir o procedimento da novação da bolsa de estudo ou pesquisa.

Atenção! Bolsas mais antigas podem ter normas diferentes, sendo aplicáveis regulamentos anteriores aos mencionados. É necessário verificar a norma vigente em cada caso, bem como as previstas nos editais e Termo de Compromisso do Bolsista.

As possibilidades de adiamento e suspensão do interstício

Ao contrário do que acreditam muitos bolsistas e ex-bolsistas, é possível aproveitar oportunidades profissionais no exterior sem que isso implique em descumprimento das obrigações assumidas junto à agência de fomento. Isso pode ser feito, por exemplo, através de:

  • Adiamento do Período de Interstício: o período de interstício é postergado para que o ex-bolsista possa realizar atividades não originalmente contempladas no plano de estudo aprovado na concessão da bolsa. O ex-bolsista inicia o cumprimento do período de interstício assim que retorna ao Brasil;
  • Suspensão do Período de Interstício: o ex-bolsista precisa interromper temporariamente a contagem do período de permanência obrigatória no Brasil para realizar atividades autorizadas pela Capes no exterior. O ex-bolsista retoma o cumprimento do período de interstício assim que retorna ao Brasil.

Enquanto a Capes possui normas específicas regulamentando essas hipóteses, o CNPq não tem regras claras, mas tem concedido tanto o adiamento quanto a suspensão em muitos casos.

A prestação de contas do período de interstício

É importante saber que tanto a Capes quanto o CNPq possuem mecanismos para o monitoramento do cumprimento da obrigação de permanência no Brasil. O encerramento do processo, em ambos os casos, se dá após prestação de contas com o envio de documentos que comprovem a permanência do ex-bolsista no Brasil.

Os documentos exigidos podem variar, mas em geral é requerido o envio de Certidão de Movimentos Migratórios emitido pela Polícia Federal. Documento que atesta todas as entradas e saídas do Brasil.

Fique atento! Mesmo que nunca tenha recebido uma cobrança documental, as agências de fomento podem cobrar esses documentos por vários anos. Existem casos, contudo, em que essa cobrança se dá mais de 5 anos depois do descumprimento da obrigação e, nessa hipótese, a cobrança pode ser discutível – assunto que tratamos no artigo sobre cobrança de ressarcimento de bolsa.

Consequências do descumprimento do período de interstício

O descumprimento do período de interstício estabelecido pelas agências de fomento pode acarretar em consequências sérias para os bolsistas, sendo a principal delas a obrigação de devolver os recursos financeiros recebidos durante o período de bolsa, com a atual taxa de câmbio, o que pode acarretar até mesmo em uma cobrança judicial.

Em caso de cumprimento parcial do período de interstício, o ressarcimento poderá ser proporcional ao período descumprido.

Além da consequência financeira mais direta, o ex-bolsista se tornará inexigível para futuras bolsas, o que pode afetar adversamente as oportunidades de financiamento para estudos ou pesquisas futuras no Brasil ou no exterior.

É fundamental que os bolsistas estejam cientes das obrigações estabelecidas pelas agências de fomento e cumpram rigorosamente o período de interstício, a fim de evitar essas consequências desfavoráveis.
Além disso, qualquer solicitação de adiamento ou suspensão do período de interstício deve ser feita de acordo com as normas estabelecidas pelas agências e dentro dos prazos estipulados para garantir a conformidade e evitar penalidades.

A VRP Advocacia possui muita experiência em casos do Direito Educacional e pode te ajudar com a renegociação do período de interstício, marque uma consulta para avaliarmos o seu caso.

Júlia Leite Valente - Advogada Sênior e Sócia Fundadora

Júlia Leite Valente

Advogada sênior sócia fundadora

É mestra em Direito Penal pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) e bacharela em Direito pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), com formação complementar pela Université de Lille, na França. É autora do livro UPPs: Governo Militarizado e a Ideia de Pacificação.