Entenda como a decisão recente do STF se aplica aos bolsistas CAPES e CNPQ
por Isabella Bettoni
No último mês, o Supremo Tribunal Federal decidiu que é constitucional a aplicação de medidas coercitivas alternativas para garantia de decisão judicial. Entre as medidas, estão a apreensão de CNH e passaporte, o que gerou dúvidas e angústias em muitos de nossos clientes com dívidas no Brasil.
Nosso escritório é especialista em casos de ex-bolsistas Capes, CNPq e outras agências de fomento. Acompanhamos muitos ex-bolsistas que, após realizarem pós graduação no exterior, recebem boas oportunidades de emprego e não retornam ao Brasil.
No entanto, existe determinação de um período de interstício, que é o tempo que o ex-bolsista deve permanecer no Brasil após a concessão da bolsa e pelo prazo que dela usufruiu. Se o bolsista não cumpre o período, precisa ressarcir o estado brasileiro pelo investimento feito.
O medo é: posso ter meu passaporte apreendido se tenho dívidas no Brasil? Claro, essa apreensão é muito mais grave se o ex-bolsista vive no exterior e depende do passaporte para permanecer trabalhando, visitando sua família no Brasil…
Mas calma! Vamos entender melhor o que prevê a decisão e como ela pode ser aplicada?
A decisão não é novidade: entenda mais
É muito importante saber que a decisão não trouxe uma previsão nova, mas apenas entendeu pela constitucionalidade de uma lei que já existia. O nosso atual Código de Processo Civil, que autoriza a aplicação das medidas coercitivas em discussão, é uma legislação vigente desde 2015!
No artigo 139 do Código é facultado ao juiz “determinar todas as medidas coercitivas necessárias para assegurar o cumprimento de ordem judicial”. Isso já estava sendo aplicado no cotidiano das instâncias inferiores ao STF.
Acontece que foi proposta a discussão sobre a constitucionalidade de medidas como a apreensão de CNH e passaporte, a suspensão do direito de dirigir e a proibição de participação em concurso e licitação pública. Isso porque estas são consequências muito graves, que restringem a liberdade das pessoas no caso de não quitação de dívidas.
A decisão recente do STF buscou proteger o poder de escolha dos juízes nos casos individuais concretos. Os juízes podem analisar quais medidas serão adequadas para que as suas decisões sejam verdadeiramente aplicadas.
Os limites para a aplicação destas medidas
Outro ponto importante é que estas medidas não podem ser aplicadas sem nenhum limite.
Na legislação brasileira temos princípios que sempre devem ser observados, como a garantia da dignidade da pessoa humana. Ficou destacado na decisão do STF que os juízes devem analisar cada caso considerando a proporcionalidade e a razoabilidade da medida. As medidas também devem ser aplicadas de modo menos gravoso ao devedor.
Ainda, a adoção de medidas mais gravosas também deve considerar: indícios de que o devedor possui patrimônio para quitação da dívida; indícios de que o devedor está se escondendo ou ocultando bens para evitar o pagamento; a demora no pagamento, entre outros.
Ainda, meios atípicos devem ser adotados de preferência subsidiariamente, ou seja, depois de serem aplicadas outras medidas mais comuns, como o protesto do nome do devedor. Além disso, é obrigatório que a decisão seja bem fundamentada, com argumentos adequados às especificidades de cada caso concreto.
Particularidades nos casos de ex-bolsistas
Reforçamos também que acompanhamos muitos casos de ex-bolsistas que querem ressarcir o estado brasileiro, mas de uma forma justa.
Assim, discutimos nos processos judiciais a amplitude da dívida. Questionamos aspectos como a data aplicável de câmbio, considerando o dólar alto; formas de parcelamento; ressarcimento parcial com cumprimento parcial de interstício, entre outros.
De forma geral, entendemos que não seria razoável de acordo com nosso ordenamento jurídico a aplicação de medidas tão graves durante a discussão sobre o valor da dívida e formas de pagamento. O ex-bolsista já demonstra sua boa fé nestas circunstâncias.
Além disso, se a apreensão de passaporte pode trazer danos muito graves (como a perda do visto e emprego no exterior; afastamento da família constituída no exterior) é possível apresentar estas circunstâncias ao juiz, que deverá considerar os limites constitucionais e a priorização da preservação da dignidade do ex-bolsista devedor.
Para entender melhor a situação em que você se encontra e os eventuais riscos do seu caso concreto, bem como tomar as providências necessárias, entre em contato, a Valente Reis Pessali Sociedade de Advogados pode ajudar.
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Este artigo foi escrito pela advogada Isabella Bettoni.